Negócios e Economia

Transformação Digital: dos Dados à Sabedoria

“A transformação digital trouxe a capacidade de elevar a níveis nunca antes alcançados a garantia da sensorização integral das empresas, isto é, colocando tudo a funcionar como uma orquestra interna de produção de dados.”

No século XXI, a competitividade do mercado empresarial tem dado o reconhecimento às empresas que sabem usar melhor os dados disponíveis nas tomadas de decisão e, em particular, daquelas que o fazem como uma cultura intrínseca. Denominam-se essas empresas por “Data Driven Companies”. A principal diferenciação é que entendem como desenvolver estratégias corretas de médio e longo prazo, com abordagens operacionais e pragmáticas de curto prazo. Tal permite-lhes criar o alicerce de posicionamento imediato, perante os concorrentes, e ganhar a dinâmica de aceleração para a liderança de futuro no seu setor de atividade.

A maioria destas empresas já não enfrenta o desafio de como obter ou de como produzir dados. O desafio centra-se no como usar e transformar os dados disponíveis, de uma forma capaz de trazer foco e valor para o negócio. Estas são organizações que já alcançaram bons graus de maturidade digital nos seus processos, possuindo culturas de melhoria contínua dos seus processos e garantindo patamares elevados de eficiência interna. Incessantemente, procuram descobrir iterativamente, e de forma contínua, como dinamizar novos modelos de negócio mais eficazes.

Em 1985, Michael Porter referiu que “a revolução da informação está varrendo a nossa economia”. Hoje, depois de mais de 30 anos dessa afirmação, quando lemos esta frase, pensamos “é óbvio e nem sei como é que ainda há gestores que baseiam muito das suas decisões em crenças”. Mas, naquela época esta afirmação foi uma revolução e certamente nem todos a entenderam, tendo em conta que vivíamos apenas um início da entrada das tecnologias no dia a dia das empresas. As décadas de 1980 e 1990, com o aparecimento de softwares de gestão de produção, de recursos humanos, de armazéns, entre outros, foram o “ensino primário” de como as empresas passaram a enfrentar o desafio da criação de dados e obtenção de informações para a tomada de decisões operacionais do dia a dia.

Hoje, nas empresas mais competitivas, a discussão dos Sistemas de Informação já não está neste patamar. Os dados e informação já são considerados commodities. Os decisores procuram informações nos seus ecossistemas digitais para adquirirem conhecimento e sabedoria, e assim assumirem a liderança nos seus mercados, uma vez que sabem obter de forma efetiva como ter vantagem competitiva perante os seus concorrentes. Este é um processo muito bem definido pela famosa pirâmide DIKW – dados, informação, conhecimento e sabedoria – caracterizado por Ackoff.

A maturidade do mundo digital trouxe consigo o conceito tempo real dos dados, isto é, a transformação digital trouxe a capacidade de elevar a níveis nunca antes alcançados a garantia da sensorização integral das empresas, isto é, colocando tudo a funcionar como uma orquestra interna de produção de dados. Cada colaborador, cada máquina, cada aplicação da empresa funciona como um músico da orquestra, onde cada pauta tocada é ouvida pelo maestro, onde cada desafinação é imediatamente identificada e corrigida. Tudo dentro destas empresas “Data Driven Companies” produz dados, os quais são analisados, que por sua vez são otimizados ou acelerados, tendo em vista o alinhamento estratégico da empresa. Ou seja, tudo dentro desta tipologia de empresas baseia-se em plataformas digitais, que contribuem para a criação de modelos de liderança e do seu posicionamento no mercado competitivo.

Ora se entendermos que uma empresa é um sistema, e como sistema que é, pode ser mapeado numa função matemática, compreenderemos que a transformação digital nos trouxe curvas crescentes de modelos de otimização da eficiência interna nos processos de negócio. Isto acontece pela capacidade indicada de em tempo real passarmos de Dados a Sabedoria. Em termos práticos, e matematicamente falando, estamos a criar declives cada vez maiores das funções derivadas nas empresas, conforme visível na Figura 1. Esta análise às derivadas é o que permite aos gestores das empresas encontrar e buscar equilíbrio para obtenção do valor ótimo de mercado da sua empresa.


Figura 1. Círculo virtuoso e infinito da Gestão de Dados em Estratégia (adaptado)

A aceleração que estamos a viver tem-se tornado evidente em plataformas mundialmente usadas como Facebook, Amazon, Google, Airbnb, entre muitos outras. O que estas empresas fizeram foi incorporar, nos seus processos de transformação de Dados em Sabedoria, modelos de Inteligência Artificial avançada, como sejam algoritmos de Machine Learning e mesmo de Deep Learning. Estamos perante a passagem da Era da Informação, identificada por Michael Porter nos anos 80, para uma Era da Predição. Tem sido esta passagem para a Era da Predição que tem permitido um maior aparecimento, dos últimos anos, de empresas unicórnios mundiais, precisamente porque souberam nascer integralmente em modelos de negócio suportados 100% em processos digitais.

Mas porque é que não estão todas as empresas a acompanhar esta evolução? Simplesmente porque estamos perante desafios muito profundos de mudança organizacional, cultural e, naturalmente, de processos. E se para uma empresa que “nasça” hoje é fácil nascer nesta filosofia da Era da Predição, para uma empresa com décadas de história, sente a dificuldade de quem pede a uma pessoa com mais de 60 anos para correr cada vez mais rápido de ano para ano até chegar à velocidade do Usain Bolt. Isto é, o único rumo para estas empresas se manterem competitivas é criar a capacidade e a filosofia interna de lideranças transformacionais que rejuvenesçam as empresas. Sem isso, as empresas continuarão a tentar correr provas olímpicas com pessoas de 60 anos e falharão certamente.

É, por isso, fundamental entender que estes são ciclos imparáveis e de pressões constantes na capacidade de liderar empresas, colaboradores e stakeholders. Quem souber gerir estas pressões de curto prazo, alinhar os Dados à Sabedoria em tempo real, definindo o rumo claro das Operações com a Estratégia, baseado em modelos de processos digitais, garantirá certamente a sua vantagem competitiva e o valor acrescentado ao mercado.

Artigo de Rui Ribeiro, autor da MIT Technology Review Portugal.

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