Governança

Crescimento exponencial requer transformação todos os dias

Transformação é tema não só para disruptivos, o disruptor também precisa de uma estratégia que habilite os seus planos de alto crescimento.

Alguns acreditam que o tema transformação está restrito às corporações maiores ou já consolidadas no mercado. O tema Transformação Digital é sem dúvida um daqueles termos que já estamos cansados de ouvir e ler. Em linhas gerais, o tema remete ao conjunto de ações estruturantes que boa parte das empresas consolidadas precisam fazer para pivotar os seus modelos de negócio e relacionamento com clientes para além do offline e por consequência mudar cultura, tecnologia, canais, processos internos, etc.

As empresas consolidadas procuram desinvestir, “diminuir” para ganhar agilidade e serem mais parecidas, neste sentido, com as startups digitais. Esta agenda mobiliza todos os segmentos de mercado, formando um movimento tão grande que ofusca muitas vezes a grande necessidade que também existe na outra ponta do mercado. As startups querem e precisam muito crescer para ocupar rapidamente os seus espaços. Para isso têm se capitalizado como nunca em rodadas de investimento visando fomentar o crescimento exponencial. Esse é o ponto desse artigo: ser exponencial é se transformar a cada dia!

A transformação numa organização exponencial requer extrema agilidade, pensar grande, mas executar em partes menores. E essas partes precisam ser recheadas de quick wins. Na prática temos todas as etapas de um movimento transformacional, só que com uma velocidade muito mais rápida.

Aplicando o Modelo de Transformação 5M em movimento scale-up de empresas digitais exponenciais

O professor Douglas A. Ready, na sua excelente cadeira “Implementing enterprise-wide transformations”, na MIT Sloan, apresenta o seu framework chamado “The 5M Transformation Model” que mostra os grandes momentos e desafios com os quais todos os líderes devem se preocupar ao promover uma transformação. Passar por estas 5 dimensões não é um requisito somente para as grandes corporações. Hoje vejo claramente que os seus ensinamentos a partir do framework que criou e aplicou em grandes corporações globais serve e deve ser aplicado também pelas organizações exponenciais, e quero explorar um pouco deste paralelo com as empresas nativas digitais em fase de scale-up acelerado.

Para crescer mais de 100% ao ano é preciso entender que tudo que está a construir hoje precisará servir num curto período de tempo para algo muito maior e mais complexo. Costumo brincar que é como comprar roupa para um filho adolescente. Se pensarmos só no tamanho que tem hoje, em poucos meses não servirá mais. A arquitetura de aplicações com a qual começará o ano será significativamente diferente daquela que terminará o período. Idem para o tamanho de equipa e como organizá-lo de forma produtiva e ágil, a quantidade de dependências entre os subdomínios, modelo operacional, quantidade de parceiros, tudo será muito maior do que é hoje.

Ter uma agenda estratégica clara e bem comunicada é fundamental para fidelizar a equipa e iniciar o movimento

Iniciando a leitura do framework pela fase de “meaning (framing the agenda)”. Ter uma agenda estratégica o mais clara possível, ainda que limitada pela névoa que a incerteza do crescimento gera, será importante para a fase de “mindset (engaging the organization)”. Foi-se o tempo em que movimentos estruturantes emplacavam só porque eram metas dos líderes. Hoje é necessário conectar essa agenda na fidelização da equipa. Uma boa agenda, mais clara e comunicada possível, ajudará muito a acender a luz do propósito de cada membro da equipa, unindo os seus próprios objetivos de carreira e vida com o que a jornada do movimento maior vai proporcioná-lo ao se fidelizar.

No caso específico de equipas de engenharia de software, nunca vivemos um momento tão exigente por este perfil como agora. A pandemia global acelerou muito o movimento digital e, além disso, o mundo aprendeu a trabalhar remotamente, superando a barreira física e geográfica. Engenheiros de software são procurados intensamente, não importa onde residem ou o segmento onde atuam e, neste cenário, é impossível atrair e fidelizar os talentos a qualquer transformação sem tocar o propósito que move cada um de nós. Cada um tem que olhar para a agenda e imaginar que sairá de alguma forma melhor do que entrou!

O desafio da enorme procura por competências não é só de engenharia de software, Analytics e Inteligência Artificial; Cybersecurity, SRE, etc. também são competências escassas que fazem a etapa “mobilization (build new capabilities)” ser uma missão especialmente difícil neste momento. Nesta etapa, conjugar atributos de ser uma empresa que gera desejo de pertencimento ao público externo, mas também de desenvolvedora de competências técnicas no grupo já existente internamente é fundamental. Não existem talentos disponíveis em quantidade suficiente para contar apenas com novas contratações, desenvolver estas competências dentro de casa se torna um imperativo neste momento.

O “dedo no pulso” para medir a pressão deve ser muito mais frequente nas exponenciais

A etapa de “measurement (aligning the organization)” tem características bem diferentes quando a transformação ocorre numa empresa de crescimento exponencial: toda jornada de transformação é composta por movimentos mais estruturantes e longos somados a outros de tiro mais curto. Sempre temos muito mais desafios e oportunidades a atacar do que recursos humanos disponíveis, independentemente da saúde da empresa ou do quão capitalizada ela está e, dado esta constante, mover as “pedras fundamentais” é algo muito importante como estratégia. Aquelas pedras que apesar de pesadas permitirão empilhar outras menores de forma sustentável e que ajudarão a alcançar um novo patamar de tecnologia para o negócio. Entretanto, uma empresa que cresce 2x ano contra ano não pode esperar meses para extrair resultados e a aferição da evolução do programa deve conseguir comprovar a geração de valor incremental e constante ao longo do tempo, o que eleva a necessidade de incluir pequenas entregas de valor constantemente, mas sem abrir mão de caminhar em paralelo com a agenda estruturante. A palavra é “e” não “ou”, o bom mix é a ciência.

Por fim, o último “M”, de “mechanisms for renewal”, também é bem peculiar neste caso. Quando a temperatura varia muito (e esta é o padrão no dinamismo do alto crescimento) temos que medir muito mais vezes do que o normal e, neste sentido, trabalhar com modelos eficazes de agilidade em escala. Crie o seu próprio conjunto de práticas que tenha fit no seu grupo, mas não deixe de priorizar e desenvolver a sua competência em traduzir com muita rapidez ajustes de estratégia em ações concretas para a equipa pois isto se torna vital e não ter essa agilidade pode custar retrabalho, perdas financeiras relevantes e muitas vezes o tempo da bola que não volta mais.

Gosto muito deste framework de transformação. Consolidado, provado e mais atual do que nunca.

Artigo de Bruno Martins, Autor – MIT Technology Review Brasil

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