Diferenciar-se dos demais é cada vez mais necessário nos tempos atuais — diria até mandatório — para que possa ser o protagonista. A competição existe em praticamente todas atividades e mercados, logo, se conseguir se destacar acima da média, certamente terá muito mais espaço para protagonizar.
Podemos usar a história da evolução do comércio como exemplo. É praticamente impossível identificar o momento exato em que tudo começou, historicamente fala-se que o comércio surgiu a partir dos processos de trocas na antiguidade, quando alguns grupos trocavam as suas produções com as de outros. Ao longo dos séculos, muitas e muitas evoluções aconteceram na operação do comércio, em especial na organização dos comerciantes para se diferenciarem nas ofertas de produtos e serviços.
Com o passar do tempo, desenvolveu-se a noção de que comercializar ou realizar o escambo não eram formas que permitiam se diferenciar ou até mesmo aumentar os retornos de maneira mais ampla. Assim, entenderam que se fizessem benfeitorias nas matérias-primas, teriam melhor retorno nas transações comerciais. Quem antes vendia apenas o couro, por exemplo, passou a criar sapatos de vários tamanhos para vender, agregando mais valor à transação, e, claro, diferenciando-se.
Após algumas décadas, o mercado entendeu que a forma de se diferenciar não era apenas oferecer ao mercado bens de consumo prontos, mas entregar um produto customizado para os seus clientes. Negócios de criação de calçados, por exemplo, sob procura e feitos especialmente para o cliente passaram a ter um valor de retorno comercial muito maior, alcançando o topo da cadeia de valorização e diferenciação de produtos.
Certamente, nos últimos 15 anos, tivemos o crescimento exponencial do sucesso de operações de comércio e produtos com base na experiência, que é hoje o principal elemento de diferenciação que uma empresa pode ter no mercado. Mas, além de entregar uma experiência marcante, a empresa deverá também prestar atenção a uma nova variável nesta equação de sucesso: a forma como posiciona a oferta no mercado.
Atualmente, a empresa que cria uma grande expectativa e entrega uma experiência fantástica certamente está acima de outras e a prosperar no mercado. Mas para ser realmente fora da média, é preciso evitar comparações da sua oferta com outros players de mercado. Isso significa que se compete com produto, aparência, preço, discurso ou solução similares ou comparáveis às suas, está a atuar num cenário de competição genérica, como se estivesse vendendo uma commodity.
Hoje, além da experiência — que pode ser inclusive parte da sua diferenciação da oferta —, deve-se possuir intangibilidade ímpar. Para entender melhor esse ponto, imagine que é um vendedor de automóveis.
Tipicamente, um comerciante de automóveis ao interagir com um cliente passaria a discursar sobre o seu produto como sendo um fantástico automóvel com 5 portas, direção hidráulica, 200 cavalos de potência, pneus de 17 polegadas, tapetes na cor dos bancos, travas elétricas e 6 marchas com sistema automático de trocas.
Neste formato, concorda que certamente ficará muito direto para um cliente comparar o carro em questão com outros modelos concorrentes, pois a caracterização do produto está baseada nas características técnicas.
Um vendedor com mais experiência saberia que, desta forma, teria muita dificuldade de se diferenciar, então apresentaria o automóvel para um cliente sinalizando a presença de um sistema inteligente de segurança, que somente liberta a porta traseira quando for seguro para a criança sair do carro e que depois trava a porta novamente oferecendo segurança para o motorista. Note que desta forma o destaque é sobre um tema valorizado pelo motorista. Mas, no final do dia, falou-se apenas sobre um item técnico presente no discurso anterior, a trava elétrica.
Mas o vendedor (ou o empresário fora da média) questionaria o cliente sobre a sua profissão e alguns itens adicionais para colocar que este automóvel na verdade não é um carro simples, é uma representação pública do sucesso que o cliente teve na carreira, uma conquista e de alguma forma um presente, um prémio, pois não é apenas grande merecedor deste conforto propiciado pelo automóvel, mas também pelo reconhecimento e respeito que pode passar a ter perante os terceiros que lhe verem neste automóvel. Um exemplo de discurso totalmente intangível, totalmente sem comparação, pois desta forma se discute algo que não tem como definir tecnicamente em nível de comparabilidade com outra oferta.
Assim, fica claro porque uma empresa ou profissional que entregar a melhor experiência, mas fundamentalmente tornar a sua oferta mais intangível possível, passará a ser a grande protagonista do mercado. Ainda no exemplo de automóveis, 2020 foi o ano de recordes de vendas de Porsches, ou seja, muito mais que um carro potente, um Porsche representa o intangível.
É o caso de marcas como a Apple, que torna os clientes não apenas fãs dos seus produtos, mas pessoas com o desejo de estarem incluídas na tribo dos utilizadores destas tecnologias e serem reconhecidas por isso. Ou acredita que a decisão no lançamento do iPod de utilizar-se de headphones com fios brancos foi apenas estética? Era a forma pela qual as pessoas poderiam sinalizar aos outros que estavam utilizando aquele produto diferenciado, e que deveriam ser reconhecidas como tal.
As pessoas que compram produtos da Lululemon, por exemplo, não compram apenas as melhores calças para praticar Yoga, mas produtos de um ícone da comunidade, uma plataforma de comunicação entre os praticantes daquele desporto, representando que não apenas está consumindo um produto de alta qualidade, mas está ajudando a sociedade e meio ambiente.
Praticar ações de alta experiência com ofertas intangíveis é o modelo de melhor diferenciação do mercado, e que certamente irá habilitar para as suas ações, seja carreira ou na empresa, um cenário de muito protagonismo.
Usei vários exemplos de empresas até agora, mas a diferenciação pode ser aplicada a um contexto profissional. Quando nos apresentamos para outras pessoas, normalmente dizemos o cargo e a empresa onde atuamos, e se a empresa não for conhecida, falamos sobre o mercado no qual atua. Por exemplo, o meu nome é Carlos Busch, sou VP da Salesforce. O meu nome é Carlos Busch, sou VP da Salesforce, uma grande empresa de CRM e e-commerce do mundo. Mas a diferenciação que me permitiria, de fato, ter melhor reconhecimento e valorização passaria por uma apresentação do tipo: sou o Carlos Busch, executivo responsável por levar tecnologia e inovação para negócios escalarem frente ao mercado competitivo.
E o leitor, como se apresenta hoje? Diferencie-se!
Artigo de Carlos Busch, Autor – MIT Technology Review Brasil