A monitorização do cérebro de bebés recém-nascidos enquanto dormem dá uma ideia de como é o seu processo de aprendizagem.
Como muitas pessoas, tenho quase a certeza de que não durmo o suficiente. No meu caso, isso deve-se em parte porque o meu filho de quatro anos gosta de me acordar diariamente para conversar entre as 4h e 6h. Tenho inveja da minha filha de dois anos, que dorme 12 horas durante a noite e tira uma soneca de duas horas à tarde. Ah, o luxo.
As crianças pequenas precisam de mais repouso do que os adultos. E a minha filha mais nova costumava passar ainda mais tempo a dormir. Nos primeiros meses de vida dela, parecia que mal estava acordada. Os cientistas ainda estão a estudar o porquê exatamente de os bebés precisarem de dormir tanto, mas uma nova ferramenta tecnológica está a começar a desvendar esse mistério e pode ajudar a revelar o que acontece dentro dos cérebros em rápido desenvolvimento de um recém-nascido.
“Este é um momento em que o cérebro [do recém-nascido] está a desenvolver novas ligações a uma velocidade enorme, algo como um milhão de sinapses por segundo”, diz Topun Austin, neonatologista consultor do NHS Foundation Trust dos Hospitais da Universidade de Cambridge, no Reino Unido. Acredita-se que essas ligações de sinapses são fundamentais para ajudar os bebés a aprender a entender o mundo ao seu redor. Mais tarde, muitas delas serão desfeitas à medida que aperfeiçoam a sua compreensão. No entanto, as primeiras semanas de um recém-nascido são a fase em que as bases decisivas são estabelecidas para a vida.
Às vezes, os investigadores colocam uma touca de elétrodos de eletroencefalograma (EEG) num bebé para estudar a atividade elétrica do cérebro. Contudo, essa análise imagética não oferece muita definição espacial, tornando difícil identificar exatamente as regiões do cérebro que estão ativas em determinado momento.
Outros estudiosos utilizam scanners de ressonância magnética para medir o fluxo sanguíneo no cérebro dos bebés. Se já fez uma ressonância magnética, pode entender por que razão essas máquinas enormes podem não ser o melhor lugar para um bebé. São barulhentas e exigem uma quietude quase perfeita da pessoa que está a ser examinada.
Austin e Julie Uchitel, antiga aluna de doutoramento na Universidade de Cambridge e agora estudante de medicina na Universidade de Stanford (EUA), e os seus colegas desenvolveram uma abordagem diferente. A equipa usou uma touca com focos de luz e sensores embutidos. Juntos, esses componentes podem medir o fluxo sanguíneo no cérebro da mesma forma que um oxímetro de pulso preso ao seu dedo num consultório médico.
Técnicas semelhantes já foram usadas para estudar o cérebro antes, mas exigem o uso de um gorro com vários cabos de fibra ótica a sair dele, algo que um recém-nascido provavelmente não iria gostar de usar para dormir. O novo dispositivo utiliza um mosaico de ladrilhos que contêm várias fontes e detetores de luz. A equipa de Austin encaixou 12 desses ladrilhos num gorro próprio para recém-nascidos, ligado a um computador com um único cabo. O sistema resultante oferece uma imagem do cérebro “pelo menos 10 vezes a resolução do [antigo] sistema de cabo de fibra ótica”, diz Austin.
Num estudo recente publicado na revista NeuroImage, a equipa pediu permissão aos novos pais para monitorizar os seus bebés enquanto os recém-nascidos ainda estavam na enfermaria pós-natal de um hospital. “É como uma pequena touca de natação. Os bebés parecem ficar muito felizes depois de colocada”, explicou Austin. A sua equipa registou a atividade do cérebro de 28 recém-nascidos enquanto dormiam.
Os bebés passam por duas fases de sono: uma ativa, acompanhada por espasmos e caretas, seguida de uma tranquila, em que o bebé fica muito quieto. A equipa filmou todos os bebés enquanto os seus cérebros eram monitorizados, para que mais tarde pudessem descobrir em qual fase do sono estava cada bebé.
Mais tarde, quando Austin e a sua equipa analisaram capturas de ecrã das gravações, notaram diferenças no cérebro dos bebés durante as fases. Durante o sono ativo, quando os bebés estavam mais inquietos, as regiões do cérebro nos hemisférios esquerdo e direito pareciam disparar todas ao mesmo tempo, da mesma maneira. Isso sugere que ligações novas e longas se estavam a formar em todo o cérebro, diz Austin. Já no sono tranquilo, parecia que se formavam mais ligações curtas.
Não está claro o porquê de isso poder estar a acontecer, mas Austin tem uma teoria. Ele acha que o sono ativo é mais importante para preparar o cérebro para consolidar uma experiência consciente de forma mais abrangente, como, por exemplo, reconhecer alguém como uma pessoa em vez de uma série de bolhas e manchas de cor e textura. Várias regiões do cérebro precisam de trabalhar juntas para alcançar isso.
As ligações mais curtas feitas durante o sono tranquilo provavelmente estão a ajustar a maneira como funcionam as zonas cerebrais individuais, diz Austin: “No sono ativo, constrói-se uma imagem e, no sono tranquilo, aperfeiçoa-se as coisas”.
Quanto mais soubermos sobre como funcionam os cérebros saudáveis dos recém-nascidos, mais aptos estaremos para ajudar os bebés que nascem prematuramente ou que sofrem danos cerebrais no início das suas vidas. Austin também espera aprender mais sobre o que cada fase do sono faz ao cérebro. Ao obter uma melhor compreensão do que o cérebro está a fazer num determinado momento, poderemos descobrir quando é mais seguro acordar o bebé para mamar, por exemplo.
Austin tem em vista uma espécie de sistema de sinalização luminosa que poderia ser colocado perto de um bebé a dormir. Uma luz verde pode sinalizar que o bebé está num estado intermediário de sono e pode ser acordado. Uma luz vermelha, por outro lado, pode indicar que é melhor deixar o bebé dormir porque o cérebro está no meio de algum processo importante.
Tentei fazer algo semelhante com os meus próprios filhos. Coloquei um brinquedo em forma de nuvem no quarto deles que fica verde e toca uma música quando é seguro acordar a mãe. Mas a nuvem é ignorada. Infelizmente, quando os cérebros deles estão prontos para despertar, não parecem importar-se que o meu não esteja.