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O processo de transformação da manufatura para uma atividade mais personalizada e centrada nas pessoas.
A Indústria 5.0 surge como uma revolução na era digital, promovendo uma profunda transformação no setor industrial. Esta nova abordagem representa não apenas a integração de tecnologias avançadas, como a Inteligência Artificial e a IoT, mas também a incorporação de novos princípios de operação, tais como a personalização em massa e a otimização sustentável dos processos produtivos. Num mercado cada vez mais competitivo, as empresas enfrentam um desafio estratégico crucial: a transição da Indústria 4.0, que foca na otimização dos processos por meio da digitalização e automação, para a Indústria 5.0, que prioriza a colaboração entre humanos e máquinas, realçando o papel crucial do ser humano no processo produtivo.
Assistimos, cada vez mais, a uma mudança de mentalidade nas organizações, com uma tendência crescente para se tornarem mais orientadas para os dados. Esta transformação é impulsionada pela abertura a novos mercados, resultando numa mudança fundamental na forma como as empresas operam. Além disso, a crescente sinergia entre as empresas tem desempenhado um papel importante ao apoiar essa mudança. Um sinal claro dessa evolução é o aumento significativo de conferências, reuniões e webinars, nas quais as organizações partilham as suas experiências e iniciativas nesta área, em constante crescimento.
No entanto, esta mudança não está isenta de desafios. A necessidade de mudar a visão, de ver os riscos como oportunidades, é um dos principais obstáculos. Há uma necessidade crescente de implementar pequenos projetos piloto, criar métricas que validem os benefícios a curto, médio e longo prazo e construir um roadmap analítico que alie a tecnologia ao negócio. Apesar disso, acredita-se que a Indústria 5.0 é não só aplicável, mas também humanizável, trazendo benefícios tangíveis para as empresas portuguesas no cenário de concorrência global.
Uma visão Integrada
As empresas em Portugal têm respondido a estes desafios com entusiasmo, mas também com cautela. Muitas delas ainda estão a fazer a transição para a Indústria 4.0 e, apesar da abundância de ideias e da vontade de mudar, a transformação do paradigma industrial e a mudança na forma de pensar nem sempre são processos lineares. Por isso, é essencial, neste momento, adotar uma abordagem tecnologicamente agnóstica, o que significa estar aberto a todas as tecnologias, sem se prender a uma específica.
A transição da Indústria 4.0 para a Indústria 5.0 representa uma mudança de paradigma que vai além dos avanços tecnológicos. Esta transição envolve a existência de valores como sustentabilidade e resiliência, mas, acima de tudo, coloca os colaboradores como elementos essenciais do processo produtivo. Em termos tecnológicos, migramos de uma fase voltada para a recolha e estruturação de dados, com uma visão fragmentada, setorizada, para uma visão integrada, de 360º, que reúne produção, qualidade, recursos humanos, procurement, entre outros aspetos. Além disso, a inteligência artificial é incorporada como um recurso adicional, enriquecendo o processo industrial como um todo, ao auxiliar em forecast, demand planning, otimização de linhas, personalização de produtos, e eficiência energética e de recursos. As tecnologias de IoT fundamentam este novo lema da Indústria 5.0, onde a máquina deixa de ser o eixo da produção, dando lugar à inteligência, às pessoas e ao cliente como foco principal.
A adoção das novas tecnologias permite a implementação de processos mais eficientes, robustos e ágeis. No entanto, o importante não é somente conhecer o que aconteceu no passado, mas sim aprender com o mesmo para tentar antecipar o futuro. Este conceito, aquando aplicado à Inteligência Artificial e ao Machine Learning, representa a aprendizagem com o passado para formação e a previsão do futuro.
Ao enfrentarmos os desafios desta transição, a cultura organizacional desempenha um papel fundamental. E é preciso analisar como esta pode apoiar a mudança e como podemos moldá-la para facilitar a transição para a nova era industrial. No entanto, as realidades são diversas, desde os mercados mais maduros nos Estados Unidos, Canadá, Ásia e países nórdicos, até os mercados intermediários, como Alemanha, Países Baixos e França, chegando ao mercado ibérico, com as suas características próprias. O desafio de adaptar pequenas e médias empresas é particularmente significativo, especialmente quando a decisão muitas vezes depende diretamente do respetivo proprietário. Nestas últimas, a produção seguiu os mesmos moldes durante décadas, com uma cultura organizacional fortemente enraizada e processos estabelecidos baseados em experiências pessoais e conhecimento tácito.
Contudo, à medida que a gestão das empresas passa para as próximas gerações, regista-se uma alteração no paradigma. Os novos gestores trazem uma visão mais inovadora, adquirida através da sua formação académica e de uma maior consciência do mercado global. A introdução de novos departamentos de inovação e a implementação de novas tecnologias estão gradualmente a transformar a cultura organizacional.
O processo de inovação tecnológica também está intrinsecamente ligado à mudança cultural. As empresas estão a começar a substituir a maquinaria antiga por equipamentos modernos, que proporcionam uma maior capacidade de implementação de projetos e iniciativas, possibilitando a recolha e análise de dados a uma escala muito maior. Contudo, o investimento necessário para essa atualização tecnológica é substancial e enfrenta, frequentemente, uma resistência baseada na mentalidade de que “se tem funcionado até agora, por que razão mudar?”.
Todos pela transformação
Neste sentido, poder-se-á concluir de que a inovação tecnológica e a mudança cultural se afiguram como sendo basilares para o sucesso aquando da transição para a Indústria 5.0. Mesmo que ocorra lentamente, a mudança cultural está a acontecer e precisa de ser cultivada por integradores, software vendors e produtores de tecnologia para facilitar a adesão a novas iniciativas. Para tornar a Indústria 5.0 uma realidade, todos os stakeholders precisam de estar alinhados. Não é uma iniciativa isolada de um departamento específico. Pelo contrário, é uma transformação que envolve toda a organização. Desta forma, a sua adoção tem implicações significativas para todas as áreas de negócio, desde os recursos humanos até à produção e sustentabilidade.
A relação entre empresas e clientes, por exemplo, sofre uma profunda transformação. Sob o lema “One size does not fit all“, a personalização em massa surge como uma oportunidade única para entender e atender o cliente de maneira mais eficaz e eficiente. Com base em análises de perfil e comportamento, as empresas podem não apenas personalizar os seus produtos e serviços, mas também identificar oportunidades para aprimorar o relacionamento com o cliente. Esse cenário coloca o cliente no centro do processo, transformando a relação tradicional entre fornecedor e cliente numa parceria mais próxima e personalizada.
Outra importante contribuição da Indústria 5.0 é a incorporação da sustentabilidade como uma dimensão essencial das operações industriais. Com a introdução de tecnologias mais eficientes, empresas estão a procurar formas de otimizar o uso de matérias-primas e energia, reduzindo assim o seu impacto ambiental. Essa abordagem sustentável estende-se, de igual forma, à promoção do bem-estar dos colaboradores, fortalecendo ainda mais a responsabilidade social corporativa. Além disso, o esforço para alcançar a autossuficiência energética, como a geração de energia renovável, reforça a aderência aos princípios da Indústria 5.0.
A colaboração entre entidades como empresas, universidades e investigadores desempenham um papel fundamental. Essa sinergia permite que o conhecimento académico seja aplicado na prática, enquanto o mundo empresarial fornece novos insights para a pesquisa académica. Esta colaboração é essencial para impulsionar a inovação, desenvolver novas soluções e enfrentar os desafios da indústria.
A próxima fase evolutiva da produção industrial, a Indústria 5.0, trará consigo mudanças significativas no contexto do mercado de trabalho. Com a crescente integração da tecnologia digital nos processos de produção, torna-se crucial a criação de departamentos de inovação dedicados à digitalização e sensorização dos processos produtivos. Essa transformação requer uma nova abordagem por parte dos profissionais, que precisarão de desenvolver uma mentalidade curiosa e uma compreensão mais profunda de toda a cadeia produtiva, desde a forma como os produtos são produzidos até a forma como os clientes e fornecedores se comportam.
A curiosidade emerge como uma competência chave. O foco deixará de residir na simples utilização de uma tecnologia ou metodologia específica, mas sim na qualidade e eficiência da produção. A capacidade de reagir rapidamente aos desafios do mercado, focar no cliente e ser resiliente são aspetos essenciais para os profissionais desta nova era industrial.
Três pilares fundamentais
Importa agora reforçar, no entanto, de que para uma implementação bem-sucedida da Indústria 5.0 é fundamental ter-se em consideração três pilares fundamentais: pessoas, responsabilidade e resiliência. Estes pilares estão intimamente interligados e revelam-se cruciais para alcançar a sustentabilidade na produção, que é um dos principais objetivos da Indústria 5.0.
A responsabilidade envolve a consideração cuidadosa do impacto energético na produção. As empresas devem procurar formas de produzir a custos mais baixos, mantendo uma alta qualidade. Isto implica uma gestão eficaz do uso de energia, que pode ser enormemente custosa, especialmente em operações de manufatura. A sustentabilidade torna-se aqui crucial, com muitas empresas a procurarem formas de se tornarem autossuficientes em energia, por exemplo, através do uso de energia solar.
A resiliência, por sua vez, refere-se à capacidade de as empresas se adaptarem rapidamente a um mercado global, em constante mudança, o que requer um elevado grau de agilidade, uma mentalidade orientada para a ação e uma resposta rápida a novos desafios e oportunidades.
No entanto, no cerne de todo o processo estão as pessoas. Mesmo com a melhor estratégia sustentável, se as pessoas não estiverem preparadas para a mudança de paradigma, o esforço será em inútil. A transição da Indústria 4.0 para a 5.0 não se trata apenas de dados e tecnologia, mas sim de motivar as pessoas para trabalhar de uma forma diferente, num regime orientado por dados. O conhecimento e a experiência dos colaboradores são essenciais para uma produção eficiente e de qualidade.
Começar pequeno e dar passos graduais é uma abordagem eficaz para a implementação da Indústria 5.0. Pequenas vitórias e conquistas podem justificar o investimento e incentivar a implementação contínua de melhorias. A tecnologia, neste cenário, torna-se uma ferramenta valiosa para permitir que as pessoas trabalhem de maneira mais eficaz e eficiente, maximizando o que as torna únicas. Em última análise, a Indústria 5.0 deve ser vista como uma ferramenta que permite às pessoas trabalharem melhor, e não necessariamente mais.
Este artigo foi escrito por João Martins, Data & Analytics & AI Manager na Noesis.