O que pensam as aranhas? Como a tecnologia DIY está a revelar a mente animal
Natureza e Espaço

O que pensam as aranhas? Como a tecnologia DIY está a revelar a mente animal

Cientistas criam dispositivos engenhosos para estudar o comportamento animal, como o mercado de “casas” dos caranguejos-eremitas.

O mercado imobiliário dos caranguejos-eremitas

Na tentativa de compreender o mercado imobiliário dos caranguejos-eremitas, o biólogo Mark Laidre, do Dartmouth College, teve de ser criativo. Estes caranguejos estão constantemente à procura de conchas maiores e melhores para habitar, mas um bom abrigo vem com riscos. Por vezes, formam grupos para expulsar um ocupante de uma concha especialmente cobiçada. Quando conseguem, o maior membro do grupo reivindica a concha, deixando uma nova disponível para outro caranguejo ligeiramente mais pequeno, numa cadeia de trocas até que todos tenham melhorado a sua condição.

Para avaliar melhor o equilíbrio entre o tamanho da concha e a sua capacidade de defesa, Laidre colaborou com um engenheiro para criar a máquina de despejo de caranguejos-eremitas. O dispositivo segura uma concha ocupada e mede a força necessária para um cientista retirar o caranguejo (sem o ferir ou deixá-lo desabrigado). Essencialmente, trata-se de uma célula de carga portátil, resistente ao sol, areia e humidade do ambiente natural.

A força necessária para despejar um caranguejo-eremita é uma métrica essencial, pois manter uma casa adequada é uma questão de sobrevivência. “Se fores despejado, há uma grande probabilidade de que o que sobra no final da cadeia seja algo demasiado pequeno para ti”, explica Laidre. Numa praia na Costa Rica, onde conduz as suas investigações, um caranguejo desabrigado pode rapidamente sucumbir a predadores ou ao calor. “Estás, literalmente, condenado.”

Criatividade no estudo do comportamento animal

Estudar a mente de outros animais apresenta desafios que os psicólogos humanos não enfrentam: os “sujeitos” não podem simplesmente dizer o que estão a pensar. Para perceber por que motivo os animais adoptam determinados comportamentos, os cientistas precisam de criar experiências inovadoras, muitas vezes construindo equipamentos experimentais do zero.

As invenções DIY (do inglês Do It Yourself, ou “faça você mesmo”) dos cientistas variam entre o extremamente simples e o altamente complexo, todas adaptadas a perguntas específicas sobre a vida e a mente de diferentes espécies, desde insectos a elefantes. Precisam as abelhas de uma boa noite de sono? O que acham as aranhas saltadoras atraente? Será que os falcões gostam de resolver quebra-cabeças? Para responder a estas questões, equipamentos prontos não são suficientes.

A máquina de despejo surgiu da curiosidade de Laidre sobre os caranguejos. Mas, noutros casos, novas perguntas emergem de dispositivos inovadores, como outro dos seus projectos: a sala de fuga para caranguejos-eremitas. Para Laidre, o essencial é garantir que as perguntas estejam ligadas à realidade dos animais.

A caixa de inovação para falcões

Papagaios e corvos são as estrelas dos estudos sobre inteligência aviária. No entanto, a ecóloga comportamental Katie Harrington, da Universidade de Medicina Veterinária de Viena, suspeitava que os caracarás estriados das Ilhas Malvinas poderiam ser igualmente brilhantes. “Adoram explorar coisas”, afirma. “São aves muito inteligentes.”

Para testar esta hipótese, Harrington inspirou-se numa “arena de inovação” concebida para as cacatuas-de-goffin, conhecidas pelas suas capacidades de resolução de problemas. Esta arena semicircular continha 20 caixas de plástico transparente, cada uma com um quebra-cabeças que, ao ser resolvido, libertava recompensas como nozes ou grãos de milho.

Como transportar esta estrutura de dois metros para as Malvinas era impraticável, Harrington concebeu uma versão compacta — a caixa de inovação — com apenas 40 cm de largura, oito compartimentos e quebra-cabeças adaptados dos estudos com papagaios.

Os falcões adoraram. “Eles corriam a toda a velocidade para participar”, relata. Os desafios incluíam puxar galhos debaixo de plataformas ou derrubar pedaços de carne de carneiro balançando tábuas. Alguns resolveram quebra-cabeças que até as cacatuas tinham achado difíceis.

Dos 15 falcões testados, 10 resolveram todos os desafios, a maioria em apenas duas sessões. Harrington criou, então, problemas mais complexos, mas alguns exigiam movimentos pouco naturais para os caracarás. O objectivo futuro é continuar a desenvolver tarefas que revelem melhor as capacidades físicas e cognitivas destas aves. “Eles mostram-nos o que são capazes de fazer, desde que lhes apresentemos desafios suficientemente bons.”

A caixa inteligente para guaxinins

Porque se adaptam tão bem os guaxinins à vida urbana? Uma teoria sugere que a sua flexibilidade cognitiva desempenha um papel fundamental. Para testar esta hipótese, a ecóloga Lauren Stanton, da Universidade da Califórnia, Berkeley, concebeu uma versão de um clássico teste de laboratório: a tarefa de aprendizagem reversa.

Neste teste, um animal aprende inicialmente a associar uma das duas opções a uma recompensa. Depois, a resposta correcta é invertida, e a outra opção passa a ser a premiada. Os animais mais flexíveis aprendem rapidamente a adaptar-se à mudança.

Para testar guaxinins selvagens na cidade de Laramie, Wyoming, Stanton e a sua equipa construíram caixas inteligentes equipadas com antenas para identificar indivíduos previamente capturados e microchipados. No interior da caixa, havia dois botões de grandes dimensões (adquiridos a um fornecedor de flippers), que os guaxinins podiam pressionar para obter comida. Um Raspberry Pi, alimentado por uma bateria de motociclo, registava os botões pressionados e alternava a resposta correcta após nove acertos consecutivos.

Muitos guaxinins — e até alguns gambás — participaram com entusiasmo, tornando difícil recolher dados consistentes. “Tínhamos múltiplos guaxinins a tentar entrar na caixa ao mesmo tempo, até três ou quatro a competir pelo espaço”, conta Stanton. Curiosamente, os guaxinins mais tímidos e dóceis foram os melhores a aprender.

O rastreador ocular de aranhas saltadoras

As aranhas saltadoras intrigam a ecóloga Elizabeth Jakob, da Universidade de Massachusetts Amherst, devido ao seu comportamento inquisitivo. Diferente da maioria dos aracnídeos, que passam a maior parte do tempo imóveis nas suas teias, as aranhas saltadoras são activas e exploram o ambiente. Jakob quer entender o que realmente importa para elas.

Para isso, utiliza um rastreador ocular baseado num oftalmoscópio modificado há mais de meio século para estudar a visão das aranhas saltadoras. O dispositivo permite projectar imagens nos olhos das aranhas enquanto um feixe de luz infravermelha rastreia os seus movimentos oculares.

A investigação revelou que quase nada chama mais a atenção das aranhas do que um ponto preto a crescer em tamanho — possivelmente um predador em aproximação.

O Insominador de abelhas

O entomólogo Barrett Klein, da Universidade de Wisconsin–La Crosse, queria saber se as abelhas sonolentas são más comunicadoras. As abelhas utilizam a “dança de meneio” para indicar locais de néctar às suas companheiras, e Klein suspeitava que a privação de sono poderia comprometer essa comunicação.

Criou, então, um dispositivo chamado Insominador, composto por ímanes de neodímio que agitavam abelhas equipadas com finas lâminas metálicas entre as asas. Os resultados mostraram que abelhas privadas de sono dançam de forma imprecisa, levando colegas a procurar alimento em locais errados.

Desde então, Klein automatizou o Insominador, evitando assim ter de passar noites em claro para observar abelhas cansadas.

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