Construa data products, ser data driven não basta!
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Construa data products, ser data driven não basta!

Com o acelerar do processo de digitalização das empresas, a consciência da importância do uso de dados para tomada de decisões tornou-se um “lugar comum”. Construir produtos inteligentes será o grande desafio. 

Há tempo se fala em ser data driven, de usar todos os dados disponíveis internos ou externos à organização para tomar decisões, pavimentar estratégias, entender o cliente, fazer melhor uso dos investimentos em marketing e inúmeras outras aplicações. Hoje, não precisamos (ou pelo menos não deveríamos precisar) gastar mais do que poucos minutos pra convencer qualquer liderança da importância de investir nesse tema.  

Os pontos de contato com os clientes, sejam os seus ou da concorrência, a quantidade de informação disponível para ser usada como input para as decisões, aumentaram exponencialmente com a recente aceleração que a pandemia Covid-19 trouxe ao processo de digitalização dos negócios de forma geral. Segundo o site Statista, saímos de uma produção e consumo de dados da ordem de 41 zettabytes, em 2019, e devemos terminar o ano de 2022 no patamar de 97 zettabytes, o que representa um aumento de 136% em relação ao período pré-pandémico.   

As transações digitais deixam rastos e pegadas, sejam numa transação comercial concluída ou simplesmente a busca feita através um cliente por uma simples informação de um produto no qual tem interesse. Tudo isso é input valioso para entendermos onde estão os desejos, as dores não atendidas dos nossos clientes atuais, ou do dos próximos que se transformarão em crescimento para os nossos negócios. Usar todos esses dados pode ser ainda um diferencial, mas logo deixará de ser. Em resumo, ser data driven será um lugar comum, uma condição de sobrevivência. Assim como uma loja física precisa de paredes de tijolos pra existir, um negócio digital precisa de dados, o oxigénio para simplesmente respirar.   

Levando em consideração que não existirá negócio sem uma parte relevante da sua cadeia de valor no ambiente digital, a alta maturidade de data literacy não será mais uma opção para organizações e profissionais nas empresas, independentemente de área ou função. Mas então o que vem em seguida no que tange dados? Inteligência no produto.   

Construir inteligência no produto é muito mais do que usar inteligência para evoluir o produto. Os chamados Data Products são produtos que usam inteligência artificial como parte integrante da engenharia do produto, não ao seu redor. A difícil notícia é que não basta juntar bons talentos; a tecnologia, processos e pessoas da organização precisam se preparar para isso.  

Comece a organizar-se como o cliente o vê 

Não confunda “como evoluir o valor do seu produto ao cliente” com “como apurar resultado financeiro do seu negócio”. Orientando-se pelo primeiro, o segundo estará no bom caminho. A construção técnica de um produto segundo a abordagem DDD (domain driven design) ocorre por domínios e sub-domínios funcionais que agregam assets técnicos. Estes domínios, precisam ser organizados sob a ótica de geração de valor (as chamadas value streams – VSs); entretanto, para se construir produtos realmente centrados na dor do nosso cliente, deveríamos organizar as VSs na forma como o cliente nos vê enquanto empresa ou produto, inserido no seu fluxo de trabalho ou jornada.   

Somente analisando funcionalmente, e evoluindo o produto na forma e sequência como o nosso cliente usa, conseguiremos ter a conexão empática com o mesmo, e isso nos servirá para buscarmos evoluções e inteligências a acoplar neste processo que realmente tragam valor percebido a ele, em forma de actionable insights. Para tal, equipas de engenharia de software, ciência de dados, produto e negócio devem trabalhar muito próximos para que estas inteligências (data products) possam ser modularizadas e consumidas por diversos pontos da jornada do cliente, e não por BU (business units), por exemplo.   

Um exemplo fácil de entender: no caso de um site e-commerce, um mesmo data product de recomendação avançada de produtos pode ser consumido tanto em tempo de busca do cliente por um produto (início da jornada), quanto como uma última sugestão, já no checkout no carrinho de compras, antes do pagamento (final da jornada).    

Experimentar é a palavra-chave 

Para “pivotar” o seu produto para o uso intensivo de data products por toda a jornada do cliente, é fundamental que se crie um ambiente de experimentação. Neste caso, não me estou a referir (somente) a ambiente técnico; falo de cultura learn fast com colaboração entre perfis complementares e processos que envolvam estas equias multi-disciplinares de dados o mais cedo possível, nos processos de ideação e problem recognition.   

Um data product não evolui linearmente e nem é tão previsível de maturar quanto um desenvolvimento puramente transacional. Embora todo tipo de desenvolvimento ágil é iterativo e incremental, para produtos inteligentes virarem mainstream do produto principal, um número bem maior de iterações se faz necessário.  

O processo de criação precisa estar preparado: um perfil de product manager com alta fluência em dados (ou data product manager), cientistas de dados e especialistas do negócio são fundamentais de entrarem já no início dos processos de ideação, identificando onde soluções cognitivas podem resolver um determinado problema de negócio.   

Fases de Lab precisam encontrar espaço de convivência com outras iniciativas mais adiantadas de engenharia; por exemplo: o seu algoritmo de busca por imagem pode estar em Lab no mesmo momento em que o algoritmo de recomendação de produtos já está em fase de produtização. As empresas, através dos seus processos e cultura, devem saber conviver com hipóteses e certezas sobre um mesmo tema simultaneamente.   

É muito comum vermos situações em que equipas tentam saltar a fase de experimentação, indo direto para uma solução de única ou nenhuma iteração; e o resultado é uma hipótese não comprovada de negócio, sem a relação causal entre as variáveis e/ou uma grande dificuldade de caminhar com suas inovações. Para tentar uma pequena amostra, e ir aumentando sucessivamente, não precisamos de um design de experiência tão elaborado, pois o objetivo principal é comprovar (ou não) a hipótese de negócio com a solução de inteligência. Ao não partir em blocos menores de testes, os casos de uso ficam mais complexos, as preocupações com experiência aumentam e uma paralisia se instala no processo de evolução dos data products.   

Defina os critérios quantitativos de validação das hipóteses para cada experiência e, após atingidos, então estenda para as amostras maiores ou totais de clientes ou segmentos, mas tenha em mente que data products, assim como qualquer bom produto, é vivo e requer evolução contínua, até que um dia seja substituído por outro ou simplesmente saia de cena.  

Usar a inteligência, para entender o que seu cliente precisa, dará à sua organização o direito de jogar, inserir inteligência por todo o seu produto, amplificando o poder do seu cliente, e a fará vencedora.
 

Este artigo foi produzido por Bruno Martins, colunista da MIT Technology Review Brasil. 

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