No meu artigo “O Decisor e a Memória Externa: A nova equação da vantagem competitiva: Racionalidade Estendida” no ponto “Racionalidade Limitada e Memória” escrevia que “segundo Herbert Simon (1979), circunstâncias complexas, tempo limitado, e um poder computacional mental inadequado reduz os decisores a um estado de “racionalidade limitada”.
Esta teoria da “racionalidade limitada” sugere que o decisor, quando confrontado com uma situação complexa, por vezes para além da sua compreensão, utiliza as suas capacidades de processamento e análise de informação para procurar alternativas, para calcular consequências, para resolver incertezas e para, de vez em quando, encontrar soluções que serão suficientes para a decisão de momento (Simon, 1965).
Simon (1979) alerta que é impossível que o indivíduo conheça todas as alternativas de que dispõe ou todas as suas consequências, o indivíduo pode percorrer apenas um caminho e nunca saberá se aquele que escolheu é o melhor, embora sob certas condições possa ter um palpite razoável.
Quanto às limitações de conhecimento, Simon (1965) propõe que não é possível ao decisor ter acesso a todas as possibilidades de ação, medindo todas as opções, tendo em vista a impossibilidade material de obter todas as informações, dados problemas de tempo e custo.
O decisor contenta-se em adquirir um número limitado de informações, “o chamado nível satisfatório”, que possibilita a identificação dos problemas e algumas soluções alternativas. “O que o indivíduo faz, na realidade, é formar uma série de expectativas das consequências futuras, que se baseiam em relações empíricas já conhecidas e sobre informações acerca da situação existente” (Simon, 1965)”.
Ciclo de Decisão ou Ciclo OODA
Tendo em conta estas limitações adota-se, como primeiro contributo para a sua resolução, o conceito de Ciclo de Decisão ou Ciclo OODA – Observação, Orientação, Decisão e Ação (Boyd, 1995).
O Ciclo OODA (acrónimo para: Observar, Orientar, Decidir e Agir) foi desenvolvido pelo Coronel John Boyd, piloto da Piloto da Força Aérea Norte Americana.
Enquanto piloto na guerra da Coreia, Boyd observou algo incomum no combate aéreo.
Na altura, os americanos utilizavam F-86 Sabres, contra os MIG-15 de fabrico russo, que eram superiores ao modelo americano. Eram mais rápidos, maiores e mais potentes, contudo, mesmo com todas essas vantagens, os pilotos americanos alcançaram uma taxa de abate de 10:1 contra os MIG-15, algo que despertou a curiosidade de Boyd.
Com esta interrogação em mente, Boyd analisou as tácticas utilizadas em combate por ambas as partes e concluiu que a grande vantagem dos F-86’s estava na maior visibilidade que o piloto possuía, tendo assim uma maior “consciência situacional”, aliada com capacidade de manobra da aeronave que era menos cansativa. Essa análise inicial levou Boyd a uma série de estudos sobre táticas de combate, estratégia de guerra e até o desenvolvimento de novos modelos de caças, acabando por desenvolver aquilo que chamamos de OODA Loop.
Sendo o OODA Loop um processo de quatro etapas para tomar decisões eficazes em situações de alto risco. Consistindo em recolher informações relevantes, reconhecer possíveis preconceitos, decidir e agir e, em seguida, repetir o processo com novas informações obtidas do mesmo processo, daí ser considerado um loop.
Aqui é importante realçar a parte do “Loop”. O processo deve ser repetido várias vezes até que o “conflito” termine. Cada repetição fornece mais informações para informar a próxima etapa, tornando-a um ciclo de feedback.
As 4 etapas do OODA Loop
1: Observar
O primeiro passo é observar a situação com o objetivo de construir o quadro mais preciso e abrangente possível.
A etapa “observação” requer a conversão de informações numa imagem geral com um significado abrangente que as coloque no contexto. Uma capacidade particularmente vital é a capacidade de identificar quais as informações que são apenas ruído e irrelevantes para a decisão atual e quais as informações que devemos prestar atenção.
Para se tomar boas decisões é preciso dominar a arte de observar o ambiente, e tal como acontecia com os F-86’s em relação aos MIG-15, em que os primeiros tinham um campo de visão mais abrangente, quanto maior for o nosso campo de visão sobre o “ambiente” que nos rodeia melhor, pois iremos capturar mais informações.
O exemplo muito concreto poderá ser o processo de triagem quando chegamos a uma urgência no hospital. A prioridade do médico(a) (ou enfermeiro(a) é descobrir quais as informações que precisa de recolher, depois recolhê-las.
Começará a fazer perguntas ao paciente, depois poderá verificar os registros do paciente, verificar os sinais vitais, como pressão arterial, e solicitar testes diagnósticos específicos.
Os médicos aprendem a captar pistas subtis que podem revelar condições específicas, como os padrões de fala do paciente, a linguagem corporal, o que trouxeram para o hospital e até mesmo o cheiro. Em alguns casos, a ausência (ao invés da presença) de certas pistas também é importante. Ao mesmo tempo, o médico precisa descartar informações irrelevantes e, em seguida, juntar todas as peças antes de poder tratar o paciente.
Depois de todas as informações possíveis recolhidas, passamos à etapa seguinte.
- Orientar
A segunda etapa é orientar, Boyd referiu-se a esta etapa como schwerpunkt, que significa “a ênfase principal” em alemão.
Orientar-se é reconhecer quaisquer barreiras que possam interferir nas outras partes do OODA Loop.
“Orientação” significa conectar-se com a realidade e ver o mundo como ele realmente é, o mais livre possível da influência de vieses cognitivos.
Boyd afirmou que orientar-se adequadamente pode ser suficiente para superar uma desvantagem inicial, como menos recursos ou menos informações, para ser mais esperto que um oponente. Identificou as seguintes quatro barreiras principais que impedem a nossa visão de obter informações objetivas:
- As nossas tradições culturais – não percebemos quanto do que consideramos comportamento universal é realmente prescrito culturalmente.
- A nossa herança genética – todos nós temos certas restrições.
- A nossa capacidade de analisar e sintetizar – se não praticamos e desenvolvemos as nossas capacidades de pensamento, tendemos a voltar aos velhos hábitos.
- O influxo de novas informações – é difícil dar sentido às observações quando a situação está sempre a mudar.
- Decidir
As etapas anteriores dão-nos uma base para tomarmos decisões informadas, obtém-se aquilo a que se chama de “informação acionável”, informações na quais podemos tomar decisões.
É preciso termos consciência que não podemos tomar as mesmas decisões repetidamente.
Esta parte do loop deverá ser flexível e aberta à atualização bayesiana.
A implicação é que devemos testar as decisões que tomamos neste ponto do loop, identificando as suas falhas e incluindo quaisquer problemas em estágios de observação futuros.
- Agir
Decidir não implica necessariamente o agir, devemos ser intencionais nas nossas decisões e colocá-las em prática, em suma, agir.
Só quando agimos é que colocamos em prática as nossas decisões.
Depois esperamos que os resultados nos indiquem se a decisão foi boa ou não, fornecendo assim informações vitais para voltarmos à primeira parte do Loop e começar novamente, agora mais bem informados que da primeira vez.
O OODA Loop no quotidiano.
“Não podemos apenas olhar para as nossas próprias experiências pessoais ou usar as mesmas receitas mentais indefinidamente; temos que olhar para outras disciplinas e atividades e relacioná-las ou conectá-las ao que sabemos das nossas experiências e do mundo estratégico em que vivemos. ”—John Boyd
Se começar a aplicar o OODA Loop nas suas decisões diárias irá notar em certas coisas que até agora lhe passavam despercebidas, e antes de aderir à sua primeira conclusão, fará uma pausa para considerar os seus preconceitos, obter informações adicionais e ser mais cuidadoso com as consequências.
E como tudo na vida, quanto mais praticar, melhor se tornará neste jogo da vida que é tomar decisões, tomando as mesmas, mas agora com todo o seu potencial.
Artigo de Rui Silva, Autor – MIT Technology Review Portugal